sábado, outubro 15, 2016

genealogia de uma carona que me pediste e eu nunca dei

(ou: o corpo é a margem da troca)

naquele dia me chamaste pra invadir uma casa
transformamos ela num santuário de amor
nos comemos vivos até queimar, fodemos sujos e depois banhados
(porque as diferentes texturas e cheiros da nossa pele produzem fome de corpo humano)
invadimos um ao outro, tomamos posse das pequenas memórias
grãos de areia no deserto da infância

soubeste dos bastidores da minha arcaica miniadoração
me comeste enquanto eu dizia a fantasia que eu usava quando era mais novo para bater punheta pra ti
gozei no teu tesão em ouvir uma coisa dessas
uma memória minha tão boba e sem função
um elemento narrativo desconexo até então
um grão de areia que insiste em ser contabilizado
grão que de repente se descobriu protagonista de um monumento sexual único

pouco a pouco, fui codificando o deserto da minha ficção masturbatória em palavras confeccionadas especialmente pra ti, pra te idolatrar, mitologia do meu próprio corpo
(enquanto isso teu humor agressivava do sono à transuda ardência)

me devoraste de olhos fechados, tatuaste tua boca pelo meu corpo, babaste na minha cara, gemeste com minhas meras palavras
achei que poderia te fazer gozar só contando falando revelando idolatrando
se o corpo é a margem da troca,
o volume da corrente é a língua