quem assombra a casa sou eu
(ou: arquitetura e anatomia)
uma casa não morre fácil
como um leproso, ela sofre exílio
nós temos que esperar que ela morra sozinha
mas acontece que a casa é melhor em esperar do que em morrer
nós as fizemos assim, para que nos esperem
fazemos as casas para que sintam nossa falta
mas
quão ignorante sou, ao ocupá-la
de que sua única opção é me odiar
me parece justo, na verdade, que uma casa odeie seu habitante
eu a entenderia perfeitamente, afinal
eu também odeio aquele que me habita
que me edificou para a sua própria conveniência
que apostou que minhas paredes nunca o trairiam
como, então, uma casa haveria de sonhar com qualquer coisa além de ser outra coisa?
sempre imagino que as casas sintam fome
sei que os quartos são seus lábios, sei que as camas são seus dentes
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