segunda-feira, março 05, 2007

Depois de um tempo, Dostoievski.

Poucas coisas pra escrever, pouco tempo pra aproveitar, poucos recursos para macaco.

Ah! Se eu não tivesse feito nada apenas por preguiça!, senhores, como eu teria me respeitado! Ter-me-ia respeitado precisamente porque me sentiria capaz ao menos de ser preguiçoso; haveria ao menos em mim uma qualidade por assim dizer positiva, na qual eu poderia acreditar. Pergunta: quem és? Resposta: um preguiçoso. Como seria agradável ouvir-se chamar assim. Significaria que eu estava definido positivamente, que havia alguma coisa que dizer sobre mim. "Preguiçoso" - bem, é um título e uma função, é uma carreira. Não brinquem, é isso mesmo. Eu teria então pleno direito a ser membro do melhor clube e me dedicaria permanentemente a respeitar a mim mesmo. Conheci um homem que se orgulhava de ser um entendido em Lafitte. Considerava isso uma virtude positiva, e nunca duvidou de si mesmo. Morreu não somente de consciência tranqüila, mas triunfante, e estava certo. Eu, pois, me escolheria uma carreira; teria sido um preguiçoso e um guloso; não um guloso vulgar, mas, por exemplo, um interessado por tudo o que é belo e sublime. Que tal? Há muito tempo penso nisso. "O belo e sublime" pesam fortemente em minha nuca desde os meus 40 anos; antes - oh, antes seria diferente! Eu teria logo encontrado uma forma de atividade adequada, por exemplo, beber à saúde de tudo quanto é belo e sublime. Teria aproveitado a menor oportunidade para deixar cair uma lágrima em meu copo e depois brindar ao belo e ao sublime. Então transformaria tudo em belo e sublime; descobriria o belo e sublime até na sujeira mais indiscutível; derramaria lágrimas tão abundantes como se fosse uma esponja molhada. Se um pintor, por exemplo, fez um quadro digno de Ghé, logo bebo à saúde do artista que fez um quadro digno de Ghé, porque amo tudo o que é belo e sublime. Um poeta escreveu o poema "Como lhe ser agradável": imediatamente bebo à saúde de quem quer que lhe seja agradável, porque amo tudo o que é belo e sublime. Merecerei por isso o respeito geral, protestarei contra quem não me demonstrar respeito. Viverei sossegadamente, morrerei solenemente - não é uma maravilha, uma perfeita maravilha? E deixarei crescer uma barriga tão rotunda, arranjarei uma papada tão cheia de dobras, providenciarei um nariz tão rubicundo que todos, ao me verem, exclamarão: "Eis um valor! eis algo real e positivo!" E, diga-se o que se disser, é muito agradável, meus senhores, ouvir tais coisas a nosso respeito num tempo tão negativo quanto o nosso.

Galera romana pra galera romana.